De setembro de 2008 a outubro de 2020, os fãs de MMA tiveram o prazer de acompanhar a trajetória de um dos atletas mais vencedores no esporte. De olhar sério e talento insuperável, Khabib Nurmagomedov ganhou o mundo ao provar que o previsível nem sempre é negativo, e deixa o esporte invicto com 29 lutas e, provavelmente, a marca melhor peso leve (até 70,3kg.) da história.
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Nascido em 1988, em Sidi, na Rússia, foi introduzido às artes marciais desde criança. Seu pai, Abdulmanap Nurmagomedov, especialista no Combat Sambo, luta agarrada desenvolvida em seu país, lapidou o pupilo de modo que se tornasse um dos atletas mais eficientes no esporte.
A confiança na modalidade era tanta que o russo chegou a causar polêmica, no Brasil, ao ostentar uma camisa com a seguinte estampa: ‘se sambo fosse fácil, se chamaria jiu-jitsu’. Na época, a atitude pegou mal e o atleta acabou fazendo uma retratação.
Mais eficiente ou não, é fato que o sambo foi a base para que Nurmagomedov chegasse ao patamar de hoje.
Treino com urso
Há alguns anos um vídeo acabou viralizando nas redes sociais. Nas imagens, uma criança aparecia praticando uma espécie de wrestling com um filhote de urso. Mesmo recebendo algumas críticas sobre o uso do animal para treinamentos, Khabib confirmou que ele era o garoto, provando que sua criação no esporte vem desde pequeno.
Pai como referência
Respeitado em seu país, Abdulmanap Nurmagomedov é conhecido como um grande descobridor de talentos para os esportes de combate. Tendo um filho com qualidades para lutar, não é difícil analisar o quanto o pai foi importante para o desenvolvimento de Khabib.
Muçulmano, o campeão do UFC segue à risca os preceitos de sua religião. Não bebe, não fuma e não há relatos de problemas envolvendo o atleta, como drogas ou outras substâncias prejudiciais.
O lutador sempre deixou claro que, mesmo se estabilizando financeiramente, não havia deixado de viver com o pai. Abdulmanap, então, atuava como uma espécie de suporte para um jovem que precisava de direção.
DO CSFU ao UFC
A primeira luta de Khabib como profissional no MMA aconteceu em setembro de 2008, pelo CSFU – Champions League. Na ocasião, o russo encarou Vusal Bayramov e, de cara, deu seu cartão de visitas: finalização no primeiro round.
De Bayramov ao Ultimate, Nurmagomedov precisou de mais 15 apresentações até chamar a atenção dos promotores do pomposo UFC. Na empresa presidida por Dana White, o ‘Águia’ chegou, em 2012, bagunçando a categoria dos leves, finalizando Kamal Shalorus no terceiro round.
Um a um, os oponentes foram ficando pelo caminho e Khabib chamava cada vez mais atenção por seu estilo diferente e eficaz.
Rumo à glória
Muitos tentaram, mas nenhum conseguiu desvendar os segredos por trás das vitórias de Nurmagomedov. Rafael dos Anjos, Michael Johnson, Edson Barboza… todos se tornaram vítimas.
Acumulando vitórias luta após luta e não dando chances ao rivais, o cinturão era questão de tempo e ele chegou, em 2018. No UFC 233, o russo estava escalado para enfrentar Tony Ferguson, mas o norte-americano acabou dando lugar a Al Iaquinta.
No embate, deu a lógica. Com performance segura, Khabib dominou o rival e conquistou o título da categoria, quebrando, inclusive, o recorde de mais rounds vencidos (32) na organização. Começava a era russa.
Conor McGregor: a rivalidade histórica
Em 2018, Khabib já era conhecido por sua invencibilidade e seus feitos acabaram enchendo os olhos dos promotores da companhia para uma oportunidade que entraria para a história: uma luta contra o fenômeno, Conor McGregor.
Naquele ponto, a fama do irlandês já havia tomado proporções nunca vistas no MMA. Rico, ex-campeão em duas divisões diferentes, talentoso e com alto grau de entretenimento, o casamento acabou sendo perfeito para os fãs.
McGregor e Conor eram a antítese perfeita. O russo, contido e religioso; o irlandês, falastrão, estravagante e sem papas na língua.
A promoção do embate entre ambos acabou extrapolando os limites do octógono. Houve ofensas familiares, desrespeito à religião, tentativa de agressão em um ônibus, entre outras.
UFC 229
Após meses de trocas de farpas, chegava o momento de acertar as contas. A data: 10 de outubro de 2018. O local: Las Vegas (EUA), palco de lutas históricas nos esportes de combate.
No confronto, Khabib tentava defender o posto que um dia havia sido de Conor, em 2016, mas que foi retirado do irlandês por inatividade. McGregor, considerado um dos melhores atletas na luta em pé do Ultimate, colocaria seu talento em jogo contra um oponente especialista na luta agarrada.
Para quem se lembra, deu a lógica. Em quatro rounds, Khabib foi superior por quase todo o tempo, dominando as ações e, inclusive, conversando com o rival durante seus ataques.
No quarto round, uma finalização que entrou para a história. Após um mata-leão quase encaixado, o irlandês não suportou a pressão do russo e bateu em desistência.
Depois, Khabib explodiu. Depois de ter sido muito provocado pelo oponente nas coletivas e redes sociais, o campeão saltou as grades do octógono e tentou agredir membros da equipe de McGregor, causando uma confusão generalizada, que rendeu ao atleta nove meses de suspensão.
Mesmo com a polêmica pós luta, o saldo do espetáculo foi mais do que positivo. Até hoje, Khabib x McGregor é a luta mais rentável da história do esporte, vendendo mais de 2,4 milhões de pay-per-view.
Retorno após a suspensão
Quando foi afastado do esporte, o UFC optou por criar um cinturão interino para a divisão dos leves. Dustin Poirier ganhou o título na superluta contra o então campeão dos penas (até 65,7kg.), Max Holloway. Só alegria para o norte-americano, no entanto, a preocupação viria a seguir: ele teria que bater Nurmagomedov para seguir como líder do grupo.
A luta entre Poirier e Khabib aconteceu em setembro de 2019, pelo UFC 242. O russo retornava ao octógono após quase um ano de inatividade.
Ao soar o gongo, no entanto, o mundo não percebeu que o atleta não se apresentava há tanto. Nurmagomedov não tomou conhecimento do norte-americano e, com facilidade, finalizou o oponente no terceiro round. Ele havia retomado seu posto.
2020: um ano de tragédias
O ano de 2020 tem sido terrível para milhões de pessoas ao redor do mundo. Com a pandemia do coronavírus, diversas famílias perderam entes queridos, na pandemia que segue fazendo vítimas em diversos países.
A Covid-19 influenciou diretamente nos esportes e, claro, também, no MMA. Khabib estava escalado para fazer a sonhada luta contra Tony Ferguson, no UFC 249. Após desinformações entre empresa e agentes, o russo acabou deixando o espetáculo e deu lugar a Justin Gaethje. Então, mais um cinturão interino.
No duelo entre os norte-americanos, Gaethje chocou o mundo e fez acontecer o que parecia impossível. Azarão, o atleta nocauteou Ferguson, um dos homens mais temidos da organização, e conquistou o direito de desafiar Khabib pela unificação dos títulos.
Morte do pai
O ano, que não estava bom, acabou sendo pior para Nurmagomedov. Seu pai, técnico e mentor, Abdulmanap, acabou sendo uma das vítimas da Covid-19 e acabou falecendo no início de julho. O campeão, então, perdia sua maior referência na carreira e responsável pelo seu sucesso no esporte.
Mesmo com a tragédia pessoal, Khabib topou encarar Justin pela unificação do título. O embate acabou marcado para 24 de outubro de 2020.
Para a luta, o russo subiria no octógono para levar à frente o legado do pai e manter sua invencibilidade no duelo.
UFC 254: o fim
Após meses de espera, chegou o dia do aguardado encontro entre Khabib e Gaethje. O palco escolhido foi Abu Dhabi, refúgio do UFC no período da pandemia para levar atletas impedidos de entrar nos Estados Unidos.
Com 28 lutas e nenhuma derrota, Khabib teria pela frente o adversário que, no papel, seria o mais perigoso de seu cartel.
Na luta, no entanto, o russo, novamente, fez parecer fácil. Seguro, dominante e implacável, Nurmagomedov precisou de dois rounds para apagar o adversário com uma finalização e cravar seu nome mais fundo na história do esporte.
Após o confronto, o inesperado. Ainda no octógono, durante a entrevista, Khabib retirou as luvas, atitude comum para quem deseja anunciar uma aposentadoria, e a palavra final: ‘foi minha última’.
O campeão, de 32 anos, afirmou que não há sentido seguir no esporte seu pai ao seu lado e revelou que havia feito uma promessa à mãe de que a luta contra Gaethje, de fato, seria a última. Assim, coloca-se o ponto final na carreira de um dos atletas mais impressionantes que o MMA já viu.
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